Artigo da Autoria de João Pedro Soares:
Ou seja, a típica “marreca” nas costas.
“Endireita as costas!” – esta foi uma frase que eu ouvi muitas vezes quando era criança.
“Põe os ombros para trás!” – esta foi outra, e, até uma ou outra vez acompanhado pela pessoa a colocar-me os ombros para trás na esperança que a minha postura assim permanecesse.
O que é que eu fiz? Nada. Mas melhorei. Ou melhor, não fiz nada com o intuito de alterar, mas fiz algo.
Comecei a treinar. O que me levou a alta competição, treinos todos os dias. Às vezes bidiários. Sei agora que não foi esse o motivo da melhoria.
Causas
O estilo sedentário, os empregos que nos obrigam a passar muitas horas em frente do computador, o teletrabalho fazem com que passemos muitas horas na mesma posição. Por mais que tentemos ter uma postura reta acabamos, passado algum tempo, por ceder e inclinar-nos.
Mas não são só estes trabalhos. Trabalhos minuciosos em que se tem em atenção ao detalhe (oleiros, costureiros), ou outros que poderíamos não associar, como dentistas. Até crianças erradamente catalogadas de hiperativas, obrigadas a “comportar-se”.
Mas…
Se esta condição está relacionada com falta de exercício, porque é que a morfologia de alguns atletas tende para este estado? Resposta: Está e ao mesmo tempo não está relacionado.
Um desporto em que este tipo de “costas” é muito comum é a escalada, contudo o crossfit, a musculação, o windsurf ou kitesurf, Muai thai ou outros que não conheça, também exibem.
Como se materializa no corpo?
Para explicar isto vou lembrar um pouco de anatomia e biomecânica.
Os nossos ombros estão relativamente soltos. Têm liberdade para se mover. Mesmo agora enquanto lê estas palavras pode elevar os ombros. Pode puxá-los para trás. Levar os ombros para a frente. Movê-los em várias direções e sentidos. A omoplata além de articular com o úmero articula exclusivamente com a clavícula. O que mantem a posição da omoplata são os nossos músculos, ligamentos e tendões.
Agora vamos imaginar que temos um músculo a puxar o ombro para a frente e outro a puxar o ombro para trás.
No nosso corpo temos muitas sinergias (músculos que funcionam em conjunto, que se ajudam mutuamente). Músculos agonistas (que fazem determinado movimento) vs músculos antagonistas (que resistem os agonistas e portanto o movimento) são o exemplo mais próximo ao que quero descrever.
Vamos agora visualizar na nossa mente músculos fracos nas costas. Os rombóides e o feixe inferior dos trapézios (ver imagem). Que têm, entre outras, a função de subir, descer ou rodar a omoplata.
Associado a isso, os músculos peitorais tensos, fortes e/ou encurtados. O que acontece nesta combinação é que a nossa posição de descanso (em que não estamos a usar nenhum destes músculos) vai começando a tender para os ombros rodados e inclinados para a frente, e, as costas com um aumento de curvatura torácica.
Mas então porque é que pessoas que praticam desporto, e às vezes muito desporto apresentam esta condição?
Estamos a falar de uma fraqueza relativa e não uma fraqueza absoluta. Numa pessoa que não pratique desporto nem atividade nenhuma podemos compreender uma fraqueza absoluta.
Num desportista trata-se de uma fraqueza relativa. Os seus músculos rombóides não conseguem igualar a tensão e força exercida pelos peitorais. Por esta razão dizer a alguém para endireitar as costas não funciona.
Se uma pessoa tem encurtamento muscular ou fascial, pode nem sequer estar muito tempo na “posição correta”. Nos casos em que consegue endireitar as costas, logo que deixe de conscientemente estar a forçar a postura, o corpo vai imediatamente voltar à posição confortável, por defeito.
É impossível uma pessoa estar atento à sua postura ininterruptamente. Mas quando a força dos músculos posteriores equiparar a dos anteriores não precisa sequer de pensar pois a postura vai naturalmente ser mais reta, com os ombros mais para trás. Para isso é necessário tratamento e fortalecimento.
Se tem esta condição ou conhece alguém que tenha pode marcar uma sessão para tratamento.
Chamada de atenção
Síndrome cruzado superior (é o nome que se dá a esta diferença de forças musculares) não é, no entanto, a única causa de hipercifose torácica. Há situações estruturais que são inerentes e por vezes muito difíceis de tratar. Esta condição que descrevo é uma que é cada vez mais frequente e que tem tratamento relativamente simples.
Este é o primeiro de quatro artigos dedicados a este tema.
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Agradecimentos
Ao Luís Ganso por me ter enviado a foto usada na “capa”
À irmã do Luís por ter tirado a foto.
Ilustrações
Desenhos feitos por mim usando como modelo arte de 加藤公太